Thursday, September 23, 2010

Guia de Cafés



Depois do sucesso do "Guia de Restaurantes", e a despeito dos pedidos em contrário, é hora de avaliar parte da rede de cafeterias que serve a região da Paulista.



GIRA MUNDO- Expresso de mais alto padrão na região. O grão é de qualidade, e a moagem aproveita-o em sua plenitude. A espuma em tom avelã denota a excelência internacional do café do Gira Mundo. O atendimento é rápido e as funcionárias se amontoam no balcão. Impossível precisar quantas pessoas trabalham lá dentro. A água com gás é cortesia, e o dono não miguela: tome antes, para melhor apreciar o café, e depois, para se livrar do sabor. O que é bom deve durar pouco.

STARBUCKS- Gigante do ramo, o Starbucks tem presença internacional somente comparável à do Gira Mundo. O expresso, em si, decepciona. Amargo, passa a impressão de que está contaminado com naftalina. A semelhança de sabor com a máquina da SEP desperta suspeitas a serem melhor investigadas. Testemunhas juram ter visto dezenas de máquinas iguais às da secretaria enfileiradas nos fundos da loja. O ponto alto da casa é o ambiente: as confortáveis poltronas e a iluminação em tom pastel convidam ao relaxamento.

MÁQUINA DA SEP- Maravilha moderna, o robô barista do Planejamento sempre provoca admiração nas visitas. Café igual para todos, sem distinção de cargo, salário ou vínculo empregatício. O menu de opções é vasto, e a máquina se dá ao luxo de esbanjar, disponibilizando um perigoso chá de limão (mortal para diabéticos). Segundo o fabricante, o assustador nível de ruídos impediu a popularização da máquina, restringindo a distribuição do modelo a aeroportos, casas noturnas e Secretarias de Estado.

EMPADAS DA VOVÓ- O forte da casa são as empadas, mas o café é de boa qualidade e o preço é honesto. Em entrevista ao blog, a Vovó garantiu que dará mais atenção aos apreciadores de um bom expresso, e não será surpresa se a Casa passar a adotar o nome “Empadas e Expresso da Vovó” ou, ainda, “Empadas Expressas da Vovó” (que sempre ri do trocadilho).

KILOUCURA CAFÉ&LOUNGE- Lounge temático do aclamado restaurante Kiloucura, a decoração é inspirada no primeiro Starbucks Saigon, aberto durante a Guerra do Vietnã. Mesas e cadeiras de plástico duro, em sintonia com a fachada em amarelo e vermelho, transportam o cliente para o clima de guerra em território asiático. Os grãos torrados com alto índice de impurezas resultam em uma exótica mistura que remete ao café. Ecologicamente correto, nada é desperdiçado: sobras do restaurante são incorporadas no processo de moagem.

Tuesday, September 21, 2010

In the book - III




Mais um trecho publicado aqui. O último... E o meu predileto, aliás. Trata-se da carta que um dos personagens envia à mãe, depois de 20 anos de ausência - e que finaliza o capítulo 2.



"Cara mãe,

Desculpe-nos, a mim e a Antonieta, do longo tempo que estivemos sem lhe dar notícias. A senhora, porém, haverá de entender que o estilo de vida o qual forçosamente abraçamos nos impede que a visitemos, bem como nos constrange de manter contato freqüente enquanto não pudermos dar termo resolutivo ao mal que nos aflige.
Desde já, peço-lhe que não se assuste com o recebimento desta carta. Esteja certa de que se a contatamos depois de prolongado recesso, não o faríamos senão para comunicar-lhe boas novas – e pedir que nos auxilie a dar cabo nesta maldição a qual com freqüência nos referimos.
Estivemos, como bem sabe, a peregrinar por todo canto do mundo em busca de nosso propósito. Inicialmente era a cura que procurávamos, mas devo confessar que a escassez de informações (e o teor negativo do pouco que nos chegou) fez com que desviássemos lentamente o foco de nossas andanças. A vida em trânsito passou a acobertar os crimes hediondos que a sanha por sangue nos impôs. O rastro tenebroso de nossa passagem encheu de pânico as comunidades das quais no servimos, embora pareça claro que de modo algum tenham atinado para a verdadeira natureza de nossa condição.
A sucessão de noites em claro e dias em trevas (não faço gosto em alongar-me na descrição do que se supõe perpétuo) solidificaram em nós uma firme predisposição para a conduta vil, egoísta e inconseqüente, de modo que já nos conformávamos da nossa sorte quando casualmente encontramos nosso malfeitor.
O vampiro não nos reconheceu de imediato, apenas sabia que estava entre iguais. Foi preciso que nos apresentássemos para que enxergasse em nós o produto de uma noite fatídica em que se aproveitara da embriaguez alheia para discorrer acerca das maravilhas da eternidade. Não houve - respondo por mim, mas creio que Antonieta compartilhe do mesmo sentimento – desejo de vingança ou acerto de contas. Queríamos respostas, e não poderia haver sujeito mais capaz de fornecê-las que o nosso criador.
Entre um e outro gole do néctar que alimenta o sobre-humano vigor vampiresco, cortesia de nosso cúmplice (a vergonha faz com que prefira poupá-la das circunstâncias desta pequena reunião), surpreendeu-nos duas vezes. Primeiro dizendo haver fundamento em nossa vontade, pormenorizando o método segundo o qual deveríamos proceder. E por último, talvez resida aqui o espantamento maior uma vez que a conduta anterior é relativamente simples, revelou a mim e à minha esposa o local onde poderíamos confrontar a origem de nossa condenação.
Espero, minha mãe, poder contar com o seu auxílio. Voltaremos a Serrópolis tão logo possível. Antecipo que não retornaremos sozinhos. A tarefa que nos foi imposta carece do auxílio de nosso instrutor. Naturalmente não pretende ajudar gratuitamente, e neste ponto se faz necessária a colaboração da senhora. É provável que ainda agora esteja a caminho, como nosso enviado, preparando a nossa chegada. Procurará pela senhora, com a intenção de adquirir a residência da família. Peço-lhe que ceda, a despeito do inconveniente da mudança.Explicarei devidamente os motivos na ocasião adequada.
A propósito, nosso criador, o vampiro que irá procurá-la, atende pelo nome de Ludovico.


Ávido pela mortalidade,
Eliseo Pereira Inácio"

Thursday, September 16, 2010

Cadê o shoyu?


Hoje, no restaurante Kiloucura:

- Vocês tem shoyu?
- Oi? - funcionário novo, surpreendido pela pergunta.
- Shoyu. Costuma ficar ali em cima - aponta para o balcão.
- Não vi ele hoje, não.
- Será que ele não está nos fundos?
- Vou ver.

Voltou logo depois. Imagino a conversa na cozinha.

- O Shoyu veio hoje? Estão perguntando por ele no salão.
- Hoje não. Mas leva esse vidrinho lá pro freguês que ele vai ficar satisfeito.

Wednesday, September 15, 2010

A onda espírita e o sexto sentido



 O Espiritismo parece estar na moda, pelo menos nas telonas nacionais. Depois do sucesso de “Chico Xavier”, é a vez de “Nosso Lar”, baseado no livro homônimo atribuído ao espírito André Luiz. Não assisti “Nosso Lar”, mas posso avaliar “Chico Xavier”: o filme é médium. O cinema americano vira e mexe explora a mesma temática, embora não me lembre de que tenham recorrido à doutrina kardecista. Preferem abordá-la em filmes de terror, ou na roupagem blockbuster.
Por coincidência, este final de semana assisti “O Sexto Sentido” na TV. Não sou exatamente um estudioso do Espiritismo, longe disso - embora tenha tido, eu próprio, uma experiência possivelmente atribuível ao sobrenatural extra-corpóreo (recorde de comentários no blog: Encontro em Família). Existe, porém, um ponto que me intriga pela inverossimilhança, justamente o tema central do filme gringo: trata-se do espírito que morreu, mas não sabe que está morto.
Ora, que tipo de espírito pode ser estúpido a ponto de não perceber que desencarnou? E quanto tempo pode durar uma confusão dessa natureza? Porque no filme o personagem do Bruce Willys passa toda a trama vagando em ignorância. Posso conceber que, logo em seguida à desencarnação, possa haver uma confusão inicial: “Morri? Vou perguntar na rua. Estão me ignorando, droga. Vou pegar o carro e perguntar em casa, lá não vão mentir pra mim. Droga, minha mão não consegue segurar a maçaneta. Puxa, entrei no carro mesmo assim. Tem algo de muito suspeito acontecendo ao meu redor. E agora? Como vou descobrir se estou morto?”. Não cola. Persistir nesse tipo de dúvida por mais de 5 minutos parece caso de alma sem salvação.

Friday, September 03, 2010

in the book - II



(Trecho do livro em produção)

Preocupada como estava, demorou para que enfim dormisse. A má sorte daquele dia fez com que o sono tão custoso fosse interrompido no meio da noite, quando as velas no altar da sala já há muito haviam sido consumidas. A octogenária era dona de um sono bastante leve, e o ruído seco do que julgou serem batidas na porta da frente do sobrado foram suficientes para despertá-la. Logo constatou que a energia não tinha retornado, o que fez com que se sentasse ao lado do criado-mudo em busca do pires e das velas que ali guardava por precaução. Vestiu-se rápido, apenas o robe branco por cima da camisola de seda, e desceu as escadas com cuidado, degrau por degrau. Uma mão à frente, segurando o pires com a vela em cima, a outra se escorando no corrimão. O final da escadaria dava direto na porta da frente, que abriu sem medo nem cerimônia. Esticou o pescoço para fora. Tinha esfriado, apertou o robe contra o corpo. Olhou para os dois lados mas nem sinal de quem batera. Retomou o rumo do quarto, desconfiando dos sentidos que, a exemplo da memória, vira e mexe lhe pregavam peças. O esforço fez com que chegasse ofegante, mas a falta de ar foi saciada pela lufada de vento que soprou da janela escancarada. Inezita não se recordava de tê-la deixado aberta, e nesse ponto não temia que fosse traída pela memória, posto que não havia chances de que tivesse conseguido dormir com aquele vento cortante a perturbá-la. Enquanto se dirigia à janela, um pressentimento ruim a tomou por inteiro, de tal modo que de imediato manifestava-se fisicamente. O coração batia acelerado, a respiração se fazia pesada. Uma vertigem súbita fez com que se detivesse por um instante. Escutou as batidas de novo, iguais as que a tinham despertado, agora na porta do seu aposento. A chama da vela não podia alcançar aquele espectro indistinto do qual só se podiam distinguir os contornos, entretanto não poderia alegar que não fizesse idéia de quem era. Pôde ver quando estendeu a mão em sua direção. O tiro, certeiro, no coração, não viu.

Thursday, September 02, 2010

Mesa Redonda


Moderador: Eles são candidatos a Deputado Federal e a Presidente por partidos diferentes. Tem trajetórias distintas, e idéias idem. Conhecidos há muitos anos pela população, os dois sequer concorrem ao mesmo cargo. Por isso mesmo, com o objetivo de enriquecer o debate político sem acirrar disputas pessoais, a Produção do Blog promove a Mesa Redonda de hoje com os candidatos José Serra e Tiririca!

Platéia: (aplausos)

M: Obrigado aos dois pela presença.

José Serra: É uma honra.

Tiririca: É nóis.

M: Para começar, vamos sortear o assunto aqui na urna. Nossa secretária, a Mulher-Pêra, está sorteando. Já sorteou! (aplausos). Vem pra cá, Mulher-Pêra, me entrega esse papel. Isso, volta pra lá agora, bem devagar. Vamos seguir, então. O assunto é... (voz tenebrosa) Planejamento.

Platéia: Uuuuuuuuuuhhh

M: Candidato Tiririca, qual a sua proposta para o Planejamento? Sob o prisma de um candidato à Câmara, devo lembrá-lo.

T: Planejamento pra mim é saber montar um programa...

JS: (baixo, para a sua equipe) Ele vai falar sobre programa de TV, quer ver?

M: Programa, Tiririca?

T: É isso mesmo (ajeita o chapéu e prossegue, falando engraçado). O PPA, instrumento constitucional do Planejamento, é estruturado em programas, vocês sabem. O problema é que a ingerência política impede que as Secretarias organizem seus programas, e suas respectivas ações, de um modo eficiente e racional. É impossível implantar a gestão por resultados do modo como é feito hoje pelos Estados, sem um instrumento estratégico dotado de indicadores de desempenho e de efetividade bem definidos. Como deputado, farei um PLC que estabeleça regras claras para o PPA, e acabe com essa distorção. Atualmente é muito difícil definir se o PPA é uma peça de gestão estratégica ou uma mera lei orçamentária.

M: É...bom... Por essa eu não esperava. Candidato Serra, o senhor, como ex-governador, o que pensa dessas críticas?

JS: O PPA, Programa Plurianual.

T: Sim.

M: À vontade, candidato.

JS: Elaborado de 4 em 4 anos.

M: O senhor tem 3 minutos.

JS: Já terminei.

M: É, bom... Acho melhor mudarmos de assunto. A Mulher-Pêra tá vindo com o papelzinho aqui.

Mulher-Pêra: Esse assunto afeta muitas pessoas, como eu e você espectador.

JS: Como a Mulher-Pêra.

M: O tema é... Gestão Pública!

T: Essa eu domino.

M: Então vai você, Tiririca. Como melhorar a gestão no setor público?

T: Essa é fácil. (Começa a balançar os braços enquanto prossegue, como se estivesse dançando). Funcionários de carreira, motivados e bem remunerados. Reduzir os comissionados e desaparelhar o Estado.

M: Olha, Tiririca, até que faz sentido o que você falou.

T: Eu sou palhaço mas não sou tonto.

M: Vou aproveitar o gancho. Candidato Serra, o que o senhor fez e pode fazer para avançar nesse caminho apontado pelo Candidato Tiririca?

JS: Florentina, Florentina...

M: Candidato Serra?

JS: (Cantarolando) 45,45...

Produção: Corta! Corta!

M: É.... Vamos ficando por aqui... alguma última palavra?

JS: Vota em mim, abestado! Senão eu vou morreeeeeeeer politicamente.

(Nota do Autor: Obviamente, o encontro é fictício e tal mesa redonda nunca aconteceu. O conteúdo da conversa é ficcional e tem fim apenas humorístico)