Saturday, February 26, 2011

Crítica Cultural



Quando alguém recomenda algum livro, filme ou música, mergulha inadvertidamente no caldeirão pulsante da subjetividade alheia, sem muita chance de sair ileso. E quanto mais ousada ou original a dica, maior o risco do caldo entornar. É por isso que deixar-se influenciar por uma crítica é como andar no escuro: a gente nunca sabe o que vem pela frente.
Desse confronto entre a opinião de um e a expectativa do outro costuma aflorar o sentimento de fracasso do crítico frustrado. Ninguém gostou da sua indicação e – pior -, ninguém dará crédito às suas próximas. É como estar aprisionado num permanente estado de suspeição, debatendo-se inutilmente na inescapável armadilha da culpa presumida. À espera de que um eventual – e improvável - futuro acerto diminua-lhe o débito.
Pessoalmente, porém, devo confessar (com humildade) que nas raras vezes em que não fui certeiro não foi a frustração da discórdia ou o receio do descrédito os sentimentos que prevaleceram no fundo de minh´alma. Não. A surpresa da rejeição alheia sempre despertou em mim um sentimento inesperado de propriedade. Como se a negação dos demais significasse tão somente que a obra eleita foi feita para mim e mais ninguém. Que há algo de meu nela e que é até bom que menos pessoas a conheçam e admirem. Mesmo porque, caro leitor, há algo nesse tipo de obra de consumo indigesto que nos expõe. E isso faz toda a diferença – para o prazer da experiência e o receio da exposição.

Aproveitando o clima de Oscar, fica a dica ao leitor: “O Discurso do Rei”, muito bom filme.

Wednesday, February 16, 2011

Damn it

Nada mais frustrante do que ter à mão o comentário certo para a plateia errada.


Monday, February 14, 2011

O abaixo-assinado


Quando mudei de escola, perto do final dos anos 90, para cursar o colegial no Objetivo, acabei indo parar no 1o Colegial F. Ficava no mesmo corredor do 1oD e do 1oE. Não era muito divertido estudar ali, com tantas brigas na sala, alunos babando, soco inglês na mochila... Tanto que começaram a fazer sentido para mim aqueles filmes no estilo “Ao Mestre com carinho”, quando um diretor sem-noção faz a limpa numa escola da periferia dominada pelas gangues. 
Cumprida a pena, no ano seguinte fui promovido para o 2oA. Enfim começaria a estudar ao lado de outros 30 e poucos nerds que tiravam boas notas e não babavam durante a aula. Numa classe dessas, o termo “turma do fundão” ganha outra conotação. São os que conseguem enxergar sem óculos.
Não é necessário dizer que os professores adoravam dar aula pra gente. Não apenas prestávamos o mínimo de atenção no que eles ensinavam, como também nossa sala era maior e mais arejada que as demais. Ficava, inclusive, em outro corredor para que não fossemos influenciados pelos animais do B para baixo. Uma espécie de apartheid letivo.
Um dos professores que gostava de dar aula pra gente era o de Geografia. Uma pena para ele que acabou arranjando treta com uma mina sangue nos olhos de alguma outra classe do corredor contrário. Acabou xingando ela de algo que realmente não me lembro, e a briga foi parar na diretoria, com os pais da garota exigindo providências. Resultado: foi demitido.  
Pouco depois, numa dessas aulas vagas que fazem a alegria da galera, uma ala da nossa turma achou que cabia fazer um abaixo-assinado pedindo a volta do professor. O documento começou a passar de carteira em carteira. Lembro-me de que, apesar de gostar das aulas do mestre, eu era indiferente à sua permanência. Ele vivia expondo os alunos ao ridículo para fazer graça, e eu temia que um dia desses chegaria a minha vez. Uma preocupação importante aos 16 anos de idade.
Pois bem. O abaixo-assinado rodou a sala e chegou no meu grupo, o do fundo, dos bad boys que enxergavam sem óculos. Fizemos uma rápida reunião para deliberar sobre o tema. Decidimos que assinaríamos, mas também acordamos que os nomes que haviam assinado até então não tinham impacto suficiente para impressionar o diretor Gilmar, figura suprema do colégio. Com o intuito único de ajudar, adicionamos por conta algumas assinaturas que certamente iriam sensibilizá-lo. Assim, o documento partiu das nossas carteiras com adesões de peso, como Nelson Mandela, João Paulo II, George Foreman e Madre Teresa de Calcutá.
Infelizmente o outro lado da sala não gostou muito da nossa iniciativa. Lembro de ter ouvidos alguns xingamentos (de bom nível, afinal éramos do 2oA) e a ideia do abaixo-assinado acabou por ali. 
Em tempo: o professor não foi readmitido.